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~ Archive for Setoff Alternatives ~

Reflexões sobre Dívidas dos Estados e dos Contribuintes

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Nas relações entre o estado e os contribuintes, ganham peso crescente as dívidas constituídas entre eles. O quadro é impressionante: os débitos dos contribuintes inscritos na Dívida Ativa da União já ultrapassam R$ 700 bilhões; os precatórios devidos pelos Estados e Municípios são estimados em R$ 100 bilhões; as dívidas previdenciárias dos Municípios se eternizam, em virtude de sucessivos planos de parcelamento.

A constituição desses débitos apenas atesta a fragilidade dos instrumentos de cobrança e a forma descuidada com eles são tratados pela administração pública e pelos contribuintes. Pretendo explorar, neste artigo, a apuração e a liquidação desses passivos e apontar caminhos que possam prevenir sua ocorrência.

Pode-se entender como verdade que os passivos tributários dos contribuintes estejam associados ao tamanho da carga tributária por eles suportada. Sem perquirir as causas que explicam o ônus tributário, devem ser arroladas inúmeras outras razões para explicar a constituição desses passivos, dentre as quais destaco a expectativa dos contribuintes de que, a qualquer tempo, haverá uma anistia.

De fato, a União, os Estados e os Municípios, a pretexto de conferir liquidez aos passivos tributários, costumam rotineiramente instituir parcelamentos combinados com anistias. Trata-se de um enorme equívoco, somente justificável em situações excepcionais, quando a administração fiscal pretende resolver complexas contendas judiciais, pela via da transação tributária.

Os parcelamentos, por sua vez, servem apenas como instrumento para fazer alguma receita fiscal e permitir ao contribuinte obter uma certidão negativa para contratar com o setor público. Muitos deles são cancelados sem que haja a liquidação dos débitos, na certeza de que virão novos parcelamentos, freqüentemente, acompanhados de anistia.

De todos os parcelamentos, o REFIS representou uma iniciativa singular. Em lugar de parcelas constantes, optou-se por vincular o pagamento a um percentual da receita bruta, ou seja, à capacidade de pagamento do contribuinte. Além disso, não se concedeu qualquer anistia.

Às críticas de que o modelo do REFIS poderia resultar em prazos longos, a resposta é óbvia: longo prazo é mais próximo do que nunca. Nenhum contribuinte conseguirá pagar mais do que sua capacidade de pagamento permite. Parcelas mensais que superem essa capacidade é apenas uma evidência franca de que está em curso a farsa da obtenção da certidão negativa. É, portanto, inadequado referir-se a parcelamentos posteriores (PAES, PAEX e outros), como REFIS I, REFIS II, etc.

A montanha de precatórios não pagos é literalmente uma vergonha. Desautoriza moralmente a cobrança da dívida ativa. Precatórios e dívida ativa são créditos constituídos à luz dos pressupostos de certeza e liquidez. Pouco importa se os precatórios resultaram de desídia ou incompetência na defesa do interesse público. O fato é que transitaram em julgado, não cabendo, pois, mais nenhum recurso contra a sentença.

Da mesma forma que os débitos dos contribuintes, os precatórios, pela magnitude que assumiram, somente poderão ser liquidados mediante parcelamento. O legislador constitucional não teve dúvida de vincular o pagamento do precatório à receita líquida corrente da entidade federativa devedora. Por que, então, não vincular também o parcelamento do contribuinte à sua receita bruta? Por que não admitir o pagamento de débitos inscritos em dívida ativa com precatórios, quando o Estado exige que, na sua liquidação, se proceda à compensação com aqueles débitos? A igualdade nas relações entre o contribuinte e o Estado é um preceito republicano fundamental.

Ganha espaço na mídia as enormes perdas fiscais que estão sofrendo os Municípios, particularmente os que dependem de transferências federais – como a imensa maioria deles. As perdas decorrem da crise econômica e dos instrumentos que vêm sendo utilizados para mitigá-la. Apenas a concessão de isenções, no âmbito do IR e do IPI, já resultou em uma redução, no valor das transferências para Estados e Municípios, superior a R$ 3 bilhões.

A situação é de tal ordem grave que muitas Prefeituras estão paralisando suas atividades pela impossibilidade de atender a seus compromissos. Por essa razão, propus a criação de um fundo de emergência capaz de assegurar minimamente os valores nominais das transferências realizadas no exercício passado, tendo como fonte a anulação de despesas consignadas no Fundo Soberano.

Para complicar ainda mais, foi anunciado um programa de parcelamento de dívidas previdenciárias dos Municípios, com prazo de amortização de 240 meses. Ocorre que nesses presumidos débitos estão incluídos valores inexistentes ou pagos a maior, por força da Súmula Vinculante nº 8 do STF que fixou em cinco anos o prazo para decadência e prescrição de débitos previdenciários.

No projeto de lei de conversão da MP nº 457, que trata da matéria, seria recomendável fixar uma moratória de seis meses no parcelamento, para que se faça uma indispensável revisão dos valores devidos. Seria também a oportunidade para alterar as regras propostas de parcelamento, substituindo-as por um percentual das transferências compulsórias federais. Se ainda restasse disposição para inovar, poderia cogitar-se da construção de um modelo que articulasse o pagamento dos débitos correntes previdenciários com a efetivação daquelas transferências, resolvendo de uma vez por todas o eterno problema das dívidas previdenciárias dos Municípios.

Everardo Maciel foi secretário da Receita-Federal

09/04/2009, GLOBO

Waldemar Jezler – www.libracap.net

Rio Grande do Sul tem Nova Tese para Barrar Precatórios

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O Estado do Rio Grande do Sul vem investindo em uma nova argumentação na Justiça que pode frustrar a expectativa de empresas que oferecem precatórios como garantia em processos de execução fiscal. A ideia da procuradoria do Estado é que, ao pedir a penhora do bem oferecido em garantia – no caso, os precatórios -, o Estado possa levar o título a leilão. Como ocorre com os demais bens, o Estado também pretende que seja realizada uma avaliação prévia do quanto esses títulos valeriam no mercado. Se for autorizada essa avaliação, as empresas correm o risco de verem o valor do precatório cair a valores ínfimos, pois não será considerado o valor de face do título. Por enquanto a tese tem sido afastada pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), mas a palavra final sobre o tema será do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que já tem um recurso nesse sentido para ser analisado.

A estratégia tem sido usada como procedimento padrão em todos os casos em que há oferecimento de precatórios para garantir execuções fiscais, segundo Marcos Miola, procurador da equipe da Procuradoria Fiscal do Estado do Rio Grande do Sul. Segundo ele, a ideia é cumprir o que está disposto no artigo 673 do Código de Processo Civil (CPC). O artigo dá duas alternativas para que a execução prossiga: a chamada “sub-rogação”, que seria a transferência da propriedade do precatório diretamente ao Estado, ou a penhora. Como o parágrafo 1º do artigo dá a possibilidade de o credor escolher entre a sub-rogação e a penhora, o Estado tem declinado da sub-rogação, quando se trata de precatório, e pedido a penhora do título. E, nesses casos, também a avaliação do título para levá-lo a leilão. “Assim como qualquer outro bem que vá a leilão, os precatórios também têm que ser submetidos a uma avaliação de mercado”, afirma Miola.

Por enquanto, o procurador afirma que há apenas uma decisão do tribunal gaúcho a favor da tese e mais de uma dezena que afastam essa argumentação. Mesmo assim, no único caso favorável ao Estado, não está claro a posição do tribunal em relação à avaliação, apesar de ter sido aceita a penhora. O procurador, porém, acredita que o STJ pode reverter essa situação, pois, ao admitir a penhora de precatórios – entendimento pacificado desde 2005 na corte -, já haveria uma sinalização de que ela deve ser feita por meio de um leilão. Nesse sentido, como afirma, seria necessário a avaliação do bem.

Entre os casos já julgados pelo tribunal de Justiça gaúcho está uma decisão de fevereiro, relatada pelo desembargador Carlos Roberto Lofego Caníbal. O processo envolve uma empresa do setor de produtos para a saúde que ofereceu um precatório, comprado de um credor, como garantia em uma execução fiscal de cobrança de ICMS. O Estado pediu a realização da avaliação do precatório e o desembargador foi taxativo ao negar o pedido do Estado, afirmando que “a existência do deságio é consequência do comportamento do próprio Estado que, sistematicamente, não honra o pagamento dos precatórios nos prazos respectivos”. Assim, afastou a predominância do deságio como valor total do precatório. Ao decidir, ele citou precedente da primeira câmara cível do TJRS, da qual faz parte, que também rejeitou o pedido de avaliação do precatório por julgar que o valor do título é o que nele está previsto – ou seja, o valor de face.

A advogada da empresa que ofereceu o precatório na execução fiscal julgada em fevereiro pelo TJ, Deise Galvan Boessio, do escritório Pimentel & Rohenkohl Advogados Associados, afirma que esse tipo de argumentação feita pelo Estado do Rio Grande do Sul tem sido recorrente em processos nos quais se oferece precatórios como garantia. Atualmente, ela cuida de três recursos interpostos nos últimos dois meses em que o Estado requer a avaliação dos precatórios oferecidos. Em todos os casos que ela assessora e em que já há decisão, os contribuintes têm tido êxito contra a estratégia do Estado do Rio Grande do Sul . “O valor de face do precatório tem prevalecido, até porque a desvalorização desses títulos vem ocorrendo por conta do Estado, que não paga os títulos em dia”, afirma. Além disso, ela tem argumentado que o artigo 673 do Código de Processo Civil, que estabelece o uso de penhora, determina que o Estado tem que se manifestar no prazo de dez dias para que o título seja alienado, o que não tem ocorrido. “Mesmo que o Estado não tivesse perdido o prazo, o valor do precatório é constante, já que se trata de crédito fixo e não variável”, afirma.

O advogado Nelson Lacerda, do escritório Lacerda & Lacerda Advogados, que também defende diversos contribuintes contra a argumentação do Estado, afirma que não haveria como esses precatórios irem a leilão por valores abaixo do valor de face. Isso, segundo ele, violaria o princípio da imutabilidade de uma decisão que resultou no valor do precatório e que seria definitiva. “Seria retirar todo o poder do Judiciário, que já tinha decidido a questão anteriormente”, diz. Em todos os casos em que essa argumentação foi utilizada nos processos por ele assessorados, Lacerda afirma ter entrado com pedido de litigância de má-fé, por tentativa do Estado em procrastinar o andamento do processo.

Adriana Aguiar, de São Paulo
Valor Online  08/04/2009

Waldemar Jezler – www.libracap.net

OAB recorre para Bloquear Dinheiro da Nossa Caixa

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Rogerio Pallatta / Valor
Marco Innocenti: valores não têm
grande impacto no orçamento do Estado

O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) voltou a tentar um novo bloqueio judicial sobre valores que o Banco do Brasil está pagando ao governo do Estado de São Paulo pela compra da Nossa Caixa. A ordem pretende fazer com que esses valores sejam destinados ao pagamento de precatórios alimentares atrasados. Ontem, a entidade propôs um agravo no próprio Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região para tentar reverter a decisão da presidente da corte, Marli Ferreira. A magistrada derrubou a liminar obtida pela OAB em primeira instância para o bloqueio desses valores até o fim da ação. O negócio entre o Banco do Brasil e o Estado foi fechado em dezembro pelo valor de R$ 5,38 bilhões – quantia que será paga em 18 parcelas mensais de R$ 299 milhões corrigidas pela Selic.

O caso Nossa Caixa é o primeiro em que a OAB tenta reverter o montante apurado com a venda de uma estatal para o pagamento de precatórios. A entidade, porém, estuda um procedimento similar para a venda, ainda em negociação, do Banrisul para o Banco do Brasil, como afirma o presidente da comissão de precatórios da seccional paulista da OAB, Flavio Brando.

O novo recurso da OAB para o caso Nossa Caixa deve ser analisado pelo presidente do TRF, mas como a corte elegeu um novo presidente na semana passada – o desembargador Baptista Pereira, que tomará posse no dia 4 de maio – ainda resta a dúvida de quem o analisará. Para Marco Antonio Innocenti, membro efetivo da comissão de precatórios da OAB-SP, a desembargadora foi influenciada pelos argumentos do governo, de que o bloqueio desses valores teriam impacto nos serviços prestados pelo Estado. Porém, segundo ele, o valor de cerca de R$ 5 bilhões obtidos com a venda seriam pouco relevantes diante dos mais de R$ 240 bilhões de orçamento do Estado- estimados para os próximos dois anos. “A verdade é que o Estado não tem interesse em pagar esses precatórios e não esteve disposto a negociar de forma consistente para solucionar o problema dos que estão atrasados há mais de dez anos”, afirma.

A OAB contra argumenta os três pontos levantados pela desembargadora ao cassar a liminar. O primeiro deles trata do sequestro de verbas. A magistrada diz que a ação da OAB seria uma forma de sequestro, o que não é permitido para precatórios alimentares. A ordem, porém, diz que o seu pedido não se enquadra nas definições de sequestro previstas na Constituição. A desembargadora também entendeu que a manutenção da liminar poderia causar grave lesão à ordem e às finanças públicas, o que é rebatido pela OAB a partir de jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabelecendo que, nesses casos, a lesão tem de ser demonstrada concretamente e não genericamente.

Marli Ferreira também expôs que os valores obtidos com a venda da Nossa Caixa não poderiam ser destinados ao pagamento de despesas correntes, como estabelece a Lei de Responsabilidade Fiscal. A OAB alega que o conceito de precatórios não se insere em despesas correntes, mas como dívida consolidada, segundo o artigo 30 da mesma lei. Procurada pelo Valor, a assessoria de imprensa da Procuradoria-Geral do Estado de São Paulo não retornou até o fechamento desta edição.

Adriana Aguiar, de São Paulo
07/04/2009, Valor Economico

Waldemar Jezler – www.libracap.net

PEC dos Precatórios Cria Distorções Econômicas

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O Senado Federal aprovou, na semana passada, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 12/06, com o alegado objetivo de solucionar um problema antigo e sério: equacionar o “enorme volume de precatórios não pagos por parte dos estados e municípios”. Essa é a justificativa constante de sua exposição de motivos, reiterada enfaticamente no relatório final da senadora Kátia Abreu, relatora da proposta. Sua redação final, entretanto, não respeitou o motivo dessa proposta e acabou por inserir dispositivos que beneficiam a União Federal, e não apenas os estados e municípios, em prejuízo de seus credores.

Alterar a Constituição Federal é algo da maior seriedade e que deve ser tratado com o mesmo nível de importância e cuidado que as suas repercussões causarão perante o país e o mundo.

As alterações a que faremos referência neste texto, acaso permaneçam no texto final a ser incorporado à Constituição Federal, representarão uma agressão aos direitos dos credores e, mais do que isso, um retrocesso para o Brasil, mediante a inclusão sorrateira de dispositivos economicamente irracionais, juridicamente viciados — por desvio de finalidade —, e eticamente injustos, com efeitos graves para a comunidade nacional e internacional.

Por esta razão, e tendo em vista que a PEC 12/06 ainda deverá ser aprovada pela Câmara dos Deputados, teceremos breves considerações, que esperamos possam provocar o debate sobre alguns aspectos da proposta que passaram em branco até o momento, e contribuir para que ao menos alguns de seus dispositivos sejam vetados ou alterados.

O meio debatido e proposto para a solução do problema das dívidas dos estados e municípios consistia, essencialmente, na criação de um sistema especial de quitação de débitos pelo qual os credores de precatórios que aceitassem o maior deságio teriam preferência no recebimento de seu crédito. O sistema especial está previsto no novo artigo 97 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), proposto pela nova redação. Inicialmente a sua redação contemplou que todos os entes da Federação — União Federal inclusive — disporiam do sistema especial, mas como isso seria evidentemente contrário à motivação original da PEC, que se limitava ao problema dos estados, Distrito Federal e municípios, a redação atual, em resposta às críticas feitas, ao menos quanto a esse ponto, retirou a União Federal da redação proposta.

O sistema do artigo 97 mereceria diversas críticas que, entretanto, já vêm sendo realizadas por diversas entidades, inclusive pela Ordem dos Advogados do Brasil e, em especial, por sua Comissão Especial dos Credores Públicos (Precatórios), de forma que o presente texto se limitará a apontar as alterações incorporadas na redação final da PEC 12/06, e que se mostram inteiramente desconectadas do seu propósito original. As alterações são aquelas incorporadas ao artigo 100 da Constituição Federal, que não excepciona sua aplicação aos estados, DF e municípios, aplicando-se, portanto, também à União Federal. Ocorre que a União Federal não apresenta qualquer problema para a quitação de suas obrigações judiciais e não precisaria ser beneficiada por qualquer nova regra, tanto que as vem cumprindo com rigor e tem acumulado, ao menos até a presente data, grande credibilidade por este fato.

A primeira mudança trata da inclusão do parágrafo 11 ao artigo 100 da CF, que prevê a alteração do critério de correção dos precatórios em geral, reduzindo drasticamente o valor dos precatórios em geral, inclusive os já expedidos e os a expedir.

A segunda trata da inclusão do parágrafo 9º ao mesmo artigo 100, que prevê a compensação dos valores devidos a título de pagamento de precatórios com débitos a que estariam sujeitos seus titulares. Tal previsão, contudo, veio sob o manto de redação obscura e geradora de incertezas quanto aos limites do que poderá efetivamente ser objeto de compensação, minando seriamente a segurança jurídica de seus detentores e, por esta mesma razão, comprometendo sua capacidade constitucionalmente garantida de comercializá-los, conforme ressaltado no relatório elaborado pela senadora Kátia Abreu.

O presente texto abordará esses dois pontos da PEC aprovada pelo Senado federal, a começar pelo primeiro deles, por implicar evidente agressão aos mais basilares conceitos de justiça, legalidade e credibilidade do país perante os seus e a comunidade internacional, além de faltar com racionalidade econômica que sustente a redação proposta.

A alteração do critério de correção monetária dos precatórios federais

A redação proposta para o parágrafo 11 do artigo 100 da CF prevê que: “A correção de valores de precatórios pendentes de pagamento, independentemente de sua natureza, será feita pelo índice oficial de correção e percentual de juros incidentes sobre a caderneta de poupança, ficando excluída a incidência de juros compensatórios”.

A adoção desse novo critério de correção, diga-se de pronto, implicaria redução substancial do valor a que têm direito os credores de precatórios em geral, tanto maior quanto maior for o prazo de seu pagamento (como no caso daqueles parcelados em dez anos). E como se vê, referido parágrafo, além de afetar não apenas os precatórios de estados, Distrito Federal e municípios, como também os devidos pela União Federal, conforme seja interpretado, poderia também afetar: (a) os precatórios parcelados na forma do artigo 78 do ADCT e (b) até mesmo os precatórios já expedidos. Há pelos menos cinco razões pelas quais o dispositivo merece ser vetado ou, quando menos, ter sua redação alterada:

(i) O índice oficial de correção incidente sobre a caderneta de poupança é, atualmente, a Taxa Referencial (TR) e sua aplicação implicaria redução abrupta — podendo chegar a 30% — em relação ao critério atual (IPCA-E). A diferença entre uma e outra poderá ser ainda maior, se de fato as indicações do governo de redução da taxa da poupança se efetivarem. Ocorre que, enquanto a redução da taxa da poupança leva em conta o fato de serem seus beneficiários isentos do imposto de renda, os detentores de precatórios sofrerão a regular incidência dos tributos, uma vez recebido seu crédito. Portanto, aplicar a mesma taxa para ambas as situações é economicamente irracional e injusto qualquer que seja o índice aplicável a caderneta de poupança;

(ii) A alteração de critério de correção dos precatórios em benefício da União Federal e prejuízo de seus credores não se justifica. A União Federal não necessita de tal auxílio, vem cumprindo rigorosamente o pagamento dos precatórios com base nos critérios (adequados) atuais e, por essa mesma razão, o objetivo e motivação da PEC 12/06 está limitado às dívidas dos estados, Distrito Federal e municípios;

(iii) A TR é atualmente o critério aplicável à correção da caderneta de poupança. Ocorre que a TR não é índice de correção monetária e não reflete a corrosão da moeda. Por essa razão o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal já se manifestaram no sentido de que o IPC é o índice adequado para essa finalidade;

(iv) Em qualquer hipótese, a alteração de critério não pode atingir os precatórios parcelados na forma do artigo 78 do ADCT, que devem ser liquidados “pelo seu valor real”. A TR não reflete a “real” corrosão da moeda. A redação do parágrafo 11, se não for vetada, deve ser alterada para esclarecimento desse ponto;

(v) Também nessa hipótese, deve-se excepcionar de forma clara que a alteração do critério não afetará os precatórios já expedidos — e que já vêm sendo pagos, no caso da união Federal —, pois do contrário haveria evidente mudança de regra no meio do jogo, com sérias e graves consequências para a imagem do país.

Vejamos com maior detalhe cada um desses pontos:

Índice oficial de correção da poupança não serve para correção de precatórios

O índice oficial de correção monetária incidente sobre a caderneta de poupança não pode ser utilizado como critério de correção monetária dos precatórios. A remuneração paga ao investidor pelas aplicações em poupança é isenta de impostos, enquanto a remuneração paga pelo precatório é tributada. Logo, o resultado líquido da remuneração paga pelo precatório será sempre inferior ao rendimento que seria pago pela poupança, não se justificando, economicamente, a aplicação da mesma taxa de correção para ambos os casos.

A diferenciação entre a correção da poupança e de outros ativos geradores de renda em função do fator fiscal vem sendo admitida pelo próprio governo, que manifestou recentemente a intenção de definir a correção da poupança em percentual incidente sobre a taxa Selic, justamente sob a justificativa de que: “ao contrário dos fundos e outras aplicações, a poupança é totalmente garantida pelo governo, tem liquidez imediata, é isenta de Imposto de Renda e, além disso, os poupadores não pagam taxa de administração aos bancos” (cf. Agência Estado, 17.03.2009).

Além disso, o atual índice de correção incidente sobre a caderneta de poupança, a Taxa Referencial, é muito inferior ao Índice de Preços ao Consumidor, que até hoje vem sendo utilizado para a correção dos precatórios federais. Portanto, tal alteração, além de inadequada, conforme se verá adiante, acarretará brutal redução do valor do crédito. Adotando-se os percentuais disponíveis nos últimos anos, a diferença entre os índices seria de mais de 4% ao ano, podendo chegar a 30% de redução ao final do prazo decenal de pagamento em relação aos precatórios parcelados sob o regime do artigo 78 do ADCT. Ou seja, além de se submeterem a um regime moratório, tais credores seriam tolhidos em parte significativa de seu crédito.

Por tais motivos, não se justificaria, primeiramente, por uma perspectiva de racionalidade econômica e de justiça, a aplicação do índice de correção da caderneta de poupança aos precatórios em geral.

Alteração de critério em beneficio da União Federal não se justifica e viola o motivo e finalidade da PEC 12/06

O princípio da legalidade previsto no artigo 5º da Constituição Federal converteu-se atualmente no “princípio da reserva legal proporcional” (proporcionalidade), exigindo cumulativamente: (a) constatação da necessidade de utilização da alteração normativa; (b) adequação dos meios utilizados e os fins perseguidos e (c) razoabilidade (proporcionalidade em sentido estrito), que significa a “proibição de excesso”, limitando a produção de normas e a execução de atos eminentemente arbitrários, injustos ou irrazoáveis do poder público.

É evidente a ausência de necessidade da alteração do critério de correção dos precatórios federais em beneficio da união Federal, que jamais atrasou o pagamento de qualquer precatório, independentemente da sua natureza. Portanto, há clara inadequação entre o meio utilizado — alteração do artigo 100 da CF em beneficio de todos os entes federativos, inclusive União Federal — e a finalidade eleita na exposição de motivos — equacionar o “enorme volume de precatórios não pagos por parte dos Estados e Municípios”. Quaisquer alterações que tenham o objetivo de aliviar as dívidas judiciais dos entes da Federação deveriam se limitar a procurar solucionar a questão das dívidas acumuladas pelos estados e municípios.

A evidente incompatibilidade entre o motivo (finalidade) da PEC 12/06 e seu parágrafo 11º, que beneficia a União Federal em prejuízo de seus credores, reforça a necessidade de seu veto.

A TR não é índice de correção monetária

Atualmente a TR é o critério aplicável à correção da caderneta de poupança. O objetivo da correção monetária é recompor a corrosão do poder aquisitivo da moeda pela inflação. Não se trata de um plus, mas uma decorrência natural do direito de propriedade garantido no artigo 5º, inciso XXII, da Constituição Federal, na linha dos precedentes proferidos pelo Supremo Tribunal Federal e pelo Superior Tribunal de Justiça[1]. Trata-se de garantia constitucional (“cláusula pétrea”), impassível de ser suprimida por meio de proposta de emenda à Constituição Federal (conforme artigo 60, parágrafo 4º, inciso IV, da CF).

O Supremo Tribunal Federal possui entendimento no sentido de que: “A taxa referencial (TR) não é índice de correção monetária, pois, refletindo as variações do custo primário da captação dos depósitos a prazo fixo, não constitui índice que reflita a variação do poder aquisitivo da moeda” (ADI 493/DF; Relator Min. Moreira Alves; Julgamento: 25/06/1992; Pleno).

A TR é um coeficiente da remuneração mensal média líquida de impostos, de títulos privados ou títulos públicos federais, estaduais e municipais (conforme artigo 1º da Lei 8.177/91). Primeiramente, apura-se o montante em dinheiro dos certificados e recibos de depósitos bancários emitidos a taxas pré-fixadas. A seguir, são determinadas, por meio de fórmula específica, as taxas média e efetiva mensais dos referidos índices certificados e recibos. Finalmente, a TR é obtida a partir da taxa média ponderada das trinta instituições relacionadas pelo Banco Central, deduzida de um redutor decorrente da tributação e da taxa real histórica de juros na economia. Assim, a TR pode ser um critério utilizado para a correção da caderneta de poupança, mas não um critério de correção monetária, já que o seu cálculo reflete a captação de recursos junto ao público e não a corrosão do poder aquisitivo da moeda.

Índice de correção monetária é um percentual que traduz, o mais aproximadamente possível, a perda do valor de troca da moeda, mediante a comparação, entre os extremos de determinado período, da variação do preço de certos bens, mercadorias, serviços, salários, dentre outros, para a revisão do pagamento das obrigações que deverá ser feito na medida dessa variação. Essa é a única forma de se apurar o “valor real” da moeda. Por esses motivos o STF e o STJ têm historicamente definido que o índice que melhor reflete a corrosão do poder aquisitivo da moeda pela inflação é o Índice de Preços ao Consumidor – IPC[2]. Nesse sentido há inúmeros acórdãos proferidos pelo STJ e STF em relação aos chamados expurgos inflacionários.

Também por essa razão a aplicação do índice de correção da caderneta de poupança (atualmente, a TR) não serve de parâmetro aos precatórios, por não constituir índice de correção monetária, devendo ser mantido, como critério de correção destes, o IPCA-E ou outro índice que reflita efetivamente a corrosão do poder aquisitivo da moeda.

O parágrafo 11 não se aplica ao artigo 78 do ADCT – caso não seja vetado, sua redação deve ser alterada para esse esclarecimento

A alteração do critério de correção dos precatórios, tal como constante da redação proposta do parágrafo 11 do artigo 100 da CF, não se coaduna com o disposto no caput do artigo 78 do ADCT, segundo o qual “os precatórios pendentes na data de promulgação desta Emenda e os que decorram de ações iniciais ajuizadas até 31 de dezembro de 1999 serão liquidados pelo seu valor real”. Ora, como visto, a TR não se enquadra no conceito de “valor real” referido por este dispositivo. Portanto, a interpretação sistemática dos dispositivos leva à conclusão de que os precatórios parcelados na forma do artigo 78 do ADCT permanecem com o critério de correção atual (IPCA-E + 6% a.a.). No entanto, a atual redação do parágrafo 11 do artigo 100 pode levar a uma interpretação dúbia e errada, qual seja, submeter também estes precatórios ao novo critério de correção. Assim, acaso não vetado, o parágrafo 11 do artigo 100 deve ser alterado para que sua redação seja clara ao excepcionar sua aplicação ao artigo 78 do ADCT, que deve continuar sofrendo a correção pelo IPCA-E, acrescido de juros legais, pois apenas assim terá sua liquidação pelo seu valor real.

A adoção de um critério distinto em relação a esses casos decorreria do próprio princípio da igualdade previsto no caput artigo 5º da CF, cujo mote consiste em tratar desigualmente os desiguais na medida das suas desigualdades. A sua aplicação ao caso concreto justificaria a adoção de um critério diferenciado em relação aos credores já submetidos à desvantajosa moratória promovida pela EC 30/00, cuja constitucionalidade até hoje é objeto de julgamento no Supremo Tribunal Federal. Observe-se que não se trata de garantia de direito adquirido a regime jurídico (no caso, regime de correção monetária), mas de garantia da eficácia da norma constitucional prevista no artigo 78 do ADCT e aplicação do princípio da isonomia.

Nesse cenário, caso não seja vetado, deveriam ser expressamente excepcionados da nova regra do parágrafo 11º os precatórios submetidos ao regime de parcelamento instituído pelo artigo 78 do ADCT, mantendo-se para estes o critério atual (IPCA-E), ou outro que reflita adequadamente a inflação do período, acrescido de juros legais.

Mudança das regras — aplicação aos precatórios já expedidos (e pagantes, no caso da união Federal) — a credibilidade do Brasil em jogo

A alteração das regras no meio do jogo é sabidamente algo que prejudica a imagem de quem o faz. Alterar o critério de correção dos precatórios mediante inserção “de carona” numa medida proposta com outros objetivos, e que ainda atinja aqueles em andamento, é medida que denigre a imagem do país perante os seus e os estrangeiros que serão atingidos. É medida que vai na contramão de uma série de tantas outras promovidas nos últimos anos, no sentido de aumentar a credibilidade do país, com demonstrações de seriedade, compromisso com a estabilidade das regras e respeito às instituições e separação dos Poderes. Esta é a dimensão do que está em jogo.

Imaginar que a redação proposta comporta interpretação que abarcaria os precatórios já expedidos seria uma agressão simplesmente intolerável perante os seus detentores.

Esses detentores vão desde credores originais — a população em geral — até investidores nacionais e estrangeiros que confiaram na estabilidade das regras do país. No cenário internacional, a credibilidade construída nos últimos anos foi fundamental ao crescimento dos investimentos efetuados por estrangeiros no mercado financeiro e por capitais brasileiros. Um volume considerável desses investimentos foi feito através de Fundos de Investimentos em Direitos Creditórios (FIDCs), lastreados em precatórios. Estima-se que há alguns bilhões de reais investidos nesses FIDCs, o que evidencia o sucesso do legislador constitucional à época da edição da emenda 30/00 que, ao prever o parcelamento dos precatórios, quis garantir sua livre e desembaraçada comercialização — como reconheceu a própria senadora Kátia Abreu no relatório da proposta aprovada.

A confiança do investidor é elemento decisivo na alocação do investimento. Os seus principais pilares são a certeza e a segurança. Os investimentos nesses fundos foram efetuados sob a premissa de gerarem uma rentabilidade esperada atrelada ao IPCA-E a título de correção monetária e juros de 0,5% ao mês. Atrelar a correção dos precatórios ao índice de correção da caderneta de poupança implicará evidente instabilidade das normas. Pior, se esta norma atingir precatórios já expedidos (pendentes de pagamento), os danos à imagem do país serão inquestionáveis, na medida em que todos os atuais detentores, inclusive instituições financeiras nacionais e estrangeiras, fundos de hedge e outros, deverão reprecificar seus ativos em função da nova forma de correção, ajustando-os nos níveis acima referidos. Será um irreparável abalo à imagem do país, a um custo alto demais. Essa conta fica muito mais cara em cenários de crise, em que a confiança — e aversão ao risco — assumem papel ainda mais relevante no processo decisório de alocação de investimentos. Medidas como essa deverão respingar como uma pedra no centro do lago, tomando graves proporções no fluxo de investimentos fundamental ao desenvolvimento econômico do país. Configuraria uma conduta ultrapassada, semelhante àquelas praticadas pelo governo nas décadas de 1980 e 1990, e que geraram “esqueletos” cujos efeitos nocivos são sentidos até hoje.

Em resumo, simplesmente não vale a pena.

A compensação dos valores devidos a título de pagamento de precatórios com débitos a que estariam sujeitos seus titulares

A redação proposta para o parágrafo 9º do artigo 100 da CF prevê que: “No momento do pagamento efetivo dos créditos em precatórios independentemente de regulamentação dele deverá ser abatido, a título de compensação, valor correspondente aos débitos líquidos e certos, inscritos em dívida ativa e constituídos contra o credor original pela Fazenda Pública devedora, ressalvados aqueles cuja execução esteja suspensa em virtude de contestação administrativa ou judicial” (grifo nosso).

Embora a justificativa do dispositivo tenha sido tornar “mais clara a regra de compensação financeira nas hipóteses em que a fazenda pública for, ao mesmo tempo, devedora e credora do titular do precatório”, a sua redação atual conduz a interpretação diversa. Da forma como se encontra redigido o dispositivo, não somente os débitos do atual credor do precatório poderiam ser objeto de compensação, mas também os débitos que o antigo credor possuísse em aberto. Assumamos a hipótese de que um detentor “A” ceda, em 2009, um precatório com dez parcelas vincendas ao cessionário “B”. À época da transação, “A” não tem quaisquer débitos em aberto — até porque, no momento da transação, o cessionário deverá verificar, como de regra verifica, se o cedente não incorreu em fraude a credores ou à execução ao alienar o seu recebível. Imaginemos, porém, que, em 2012, “B” esteja para receber o pagamento da terceira parcela do precatório que adquiriu. Ainda que “B” não possua quaisquer débitos em aberto neste momento, se “A” tiver contraído débitos que já estejam inscritos em dívida ativa, “B” poderá ser surpreendido e ter o valor de sua parcela reduzida na proporção de tal débito, então contraído por “A”. Seria um evidente absurdo. Mas é o que se pode ler da norma.

A previsão de compensação, tal como redigida atualmente, acarreta enorme insegurança, que comprometerá sobremaneira — caso não inviabilize por completo — a capacidade de os detentores de precatórios comercializarem seus títulos, como quis o legislador constitucional. Como bem ressaltou a senadora Kátia Abreu ao negar aprovação à emenda 2, não seria legítima a quebra da “possibilidade já constitucionalizada anteriormente, qual seja a de parcelamento e comercialização de precatórios, uma das formas que o Parlamento Nacional encontrou para tentar permitir ao credor de precatórios a recuperação, pelo menos parcial, de seus créditos judicialmente reconhecidos contra as Fazendas Públicas”. Pois é justamente o que ocorrerá se a redação do referido parágrafo 9º não for alterada.

Melhor que fosse vetado o parágrafo, dado que pretende implementar sistema de compensação já vetado anteriormente pelo Supremo Tribunal Federal — ainda que por razões de ordem técnica —, ou, quando menos, que seja substituído o termo “credor original” pelo termo “detentor do precatório”, o que permitiria cumprir, de forma adequada, a “compensação financeira nas hipóteses em que a fazenda pública for, ao mesmo tempo, devedora e credora do titular do precatório”, afastando a indesejada segurança que a redação atual oferece. Até porque, como redigida, permite compensação entre devedor e “antigo” credor, o que sequer é razoável.

Em conclusão, como se vê, as alterações propostas para o artigo 100 da Constituição merecem grande reflexão. A questão da mudança de critério prevista no seu parágrafo 11 é a mais séria delas. Implica alteração economicamente injusta e tecnicamente inadequada. Não deveria ser instituída para nenhum dos entes. Caso o fosse, apenas se justificaria sob a perspectiva de reduzir por mais essa via a dívida dos entes da federação, o que já se propõe esteja sendo cuidado — ainda que de forma também inadequada — pelo artigo 97 do ADCT e, assim, também não passa. Em qualquer hipótese, qualquer medida neste sentido deveria ter sua aplicação limitada aos precatórios estaduais, do DF e municipais, e excepcionar expressamente sua aplicação aos precatórios parcelados na forma do artigo 78 do ADCT, bem como, e em especial, no que diz respeito aos precatórios já expedidos.

Nossa Câmara de Deputados tem em suas mãos o poder de ratificar a idéia de que o país mudou e hoje pode contar com a confiança dos seus e da comunidade internacional. Ou, simplesmente, adotar o caminho mais fácil e aprovar a PEC 12/06 na redação encaminhada pelo Senado. Vivemos hoje épocas muito difíceis. São momentos em que os atos repercutem de forma ampla nos nossos caminhos. O caminho mais fácil raramente é o melhor. Especialmente agora, não o parece ser. Cabe esperar que nossos representantes pensem da mesma forma.


[1] No entendimento do STJ, o direito à correção monetária “constitui mero princípio jurídico aplicável a relações jurídicas de todas as espécies e de todos os ramos do direito. É ressabido que o reajuste monetário visa exclusivamente a manter no tempo o valor real da dívida, mediante a alteração de sua expressão nominal. Não gera acréscimo ao valor nem traduz sanção punitiva. Decorre do simples transcurso temporal, sob regime de desvalorização da moeda. A correção monetária consulta o interesse do próprio Estado-Juiz, a fim de que suas sentenças produzam – tanto quanto possível – o maior grau de satisfação do direito cuja tutela se lhe requer” (Resp nº 20.924-2, julgado em 20.05.92, DJU de 15.06.92).
[2] O STJ consolidou o entendimento de que “deve ser seguido, em qualquer situação, o índice que melhor reflita a realidade inflacionária do período, independentemente das determinações oficiais. Assegura-se, contudo, seguir o percentual apurado por entidade de absoluta credibilidade e que, para tanto, merecia credenciamento do Poder Público, como é o caso da Fundação IBGE. É firme a jurisprudência desta Corte que, para tal propósito, há de se aplicar o IPC, por melhor refletir a inflação à sua época” (Resp nº 505.803). E, ainda: “se na vigência de sucessivos planos econômicos implantados pelo Governo continuou a existir inflação, deve ser aplicado o verdadeiro índice que reflita a real inflação do respectivo período e este resultado só será alcançado se a indexação for feita pelo IPC” (Resp 47.852-9/SP e Resp 43.046/SP).

Luiz Felipe Coutinho Dias de Souza é advogado em São Paulo, sócio da Jus Finance e mestre em Direito com especialização em Direito Tributário Internacional pela Harvard University

Daniel Gatschnigg Cardoso é advogado em São Paulo, sócio da Jus Finance e mestre em Direito Econômico e Financeiro pela Universidade de São Paulo (USP)

Revista Consultor Jurídico, , 6 de abril de 2009

Waldemar Jezler – www.libracap.net

Estados e Municípios Buscam Alívio Contra Crise Financeira

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Governadores e prefeitos conseguiram ontem a primeira vitória na mobilização contra a crise financeira. Diante da perda de receitas e das dificuldades de caixa por causa do desaquecimento da atividade econômica, eles pressionaram o Congresso a acelerar a tramitação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos Precatórios. E depois de várias semanas de baixa produção em decorrência da sucessão de escândalos envolvendo a estrutura do Legislativo, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou ontem, por unanimidade, a PEC.

O lobby dos estados e municípios também está voltado para o Palácio do Planalto e terá de ser enfrentado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva nos próximos dias, quando retornar de sua viagem ao exterior. Alegando perdas de receitas – principalmente pela queda no repasse dos recursos do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), formado com parte do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e Imposto de Renda, ambos arrecadados pela União -, as prefeituras estão em pé de guerra, como definem os analistas da Santa Fé Idéias.

“Setores da oposição pensam na criação de um fundo de emergência para os municípios e em mudanças na medida provisória que refinancia débitos das prefeituras com o Instituto Nacional do Seguro Social”, informam os analistas da Santa Fé Idéias, que acompanham o cenário político na capital federal.

Política

As queixas estão ganhando uma dimensão ainda maior por causa da conotação política às mobilizações. Ontem, prefeitos ligados ao Democratas (DEM), ao PSDB e ao PPS realizaram em Brasília o Encontro Nacional pela Sobrevivência dos Municípios. Outro movimento está previsto para acontecer na capital federal no próximo dia 7, quando será discutida a situação dos municípios e a crise econômica.

O líder do DEM, deputado Ronaldo Caiado (GO), afirmou que o partido vai apresentar cinco emendas à Medida Provisória 459, que cria o Programa Habitacional Minha Casa, Minha Vida, do governo federal. As emendas propõem, entre outros pontos, a declaração de uma moratória de seis meses das dívidas dos municípios com o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), para que ela não seja descontada do FPM.

As sugestões foram aprovadas ontem durante o encontro, realizado na Câmara, com prefeitos de vários estados do país. Entre as emendas, o DEM quer que os recursos do Fundo Soberano do Brasil sejam repassados a um fundo fiscal de investimentos, para serem utilizados na compensação das perdas dos municípios nos últimos meses, com validade até o fim da crise.

“O que está acontecendo com os municípios é uma calamidade pública”, acrescentou o presidente da União Nacional dos Vereadores, Eliezer Fernandes.

Um estudo da Confederação, levando em conta medidas adotadas a partir de janeiro e até essa segunda-feira, apontam para uma perda de R$ 2,1 bilhões no FPM. Na avaliação da entidade, com base em informações da Secretaria da Receita Federal, o governo federal abriu mão de R$ 8,9 bilhões em receitas, com mudanças no IPI, correção da tabela do Imposto de Renda e outras medidas de incentivo ao setor produtivo.

De acordo com levantamento da CNM, desse total a União renuncia a R$ 4,2 bilhões, enquanto estados e municípios deixam de receber R$ 4,7 bilhões. São repasses para o FPM, para o Fundo de Participação dos Estados (FPE) e para o Fundo de Compensação pela Exportação de Produtos Industrializados (FPEX).

PEC dos precatórios facilita regras para o setor público

A principal alteração da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 12/2006, em relação às regras vigentes, é a redução do comprometimento financeiro de estados e municípios com o pagamento de precatórios. A PEC prevê que no máximo 1,5% da receita líquida de estados, dos municípios e da União seja destinada ao pagamento das dívidas que as três instâncias de governo têm com cidadãos. No caso dos estados, o percentual vai variar de 0,6% a 2% da receita líquida e, para municípios, de 0,6% a 1,5%.

Os valores a serem pagos deverão ser divididos em duas formas: 40% serão pagos diretamente para quem já está na fila, priorizando os precatórios menores e as pessoas com mais de 60 anos.

Os outros 60% deverão ser pagos na forma de leilão de deságio, que funciona como uma forma de negociação em que o credor aceita deixar de receber o valor total que a Justiça havia determinado como dívida do Estado.

A ideia era votar ainda ontem à noite a PEC 12/2006 no plenário da Casa, abreviando o período regimental de cinco sessões entre a votação na CCJ e no plenário. A relatora da PEC, senadora Kátia Abreu (DEM-TO) – que substituiu semana passada o senador Valdir Raupp (PMDB-RO) na relatoria -, defendeu este formato. Ela alega que o credor não sairá prejudicado, já que a adesão ao leilão não é obrigatória. “Ele só entra no leilão se quiser, se achar que tem um valor tão alto para receber que vale a pena fazer um abatimento”, afirmou.

Ainda de acordo com a Kátia Abreu, os precatórios devidos somam cerca de R$ 100 bilhões. A relatora negou que os senadores não tenham pensado nos contribuintes que aguardam para receber os valores. “O projeto vai garantir que o pagamento seja efetuado de verdade. O pagamento de precatórios hoje é uma ficção, com percentual baixíssimo de adimplência [por parte do Estado]”, disse.

De acordo com a última informação oficial sobre as dívidas dos estados com precatórios, divulgada pelo Supremo Tribunal Federal e com base em 2005, encabeçam a lista São Paulo (R$ 13,6 bilhões), Espírito Santo (R$ 7 bilhões) e Minas Gerais (R$ 5,3 bilhões), governados pela oposição.

Para advogado, mudanças desrespeitam Constituição

O substitutivo à PEC 12, em votação no Senado, representa um avanço e um retrocesso, na opinião do advogado Nelson Lacerda, advogado da Lacerda & Lacerda Advogados. “O texto avança ao permitir a compensação tributária. Além disso o substitutivo, cria punições pela não inclusão no orçamento e prevê o sequestro de verba em caso de descumprimento. Dá preferência aos precatórios alimentícios e mantém a regra do artigo 100 da Constituição Federal”, argumenta.

Entretanto, pela proposta, somente é permitida a compensação em relação a débitos do credor original,” quando deveria liberar para terceiros cessionários também”. Segundo o advogado, este é um dos retrocessos. “A PEC retrocede também quando reduz o percentual de destinação de verba para pagamento dos precatórios, eternizando o calote caso não seja liberada a compensação plena”, destaca.

“Por fim, a manutenção dos leilões de deságio é uma afronta, a menos que se libere efetivamente a compensação plena. Neste caso haveria valorização dos precatórios”, critica.

Já o sócio do Viseu, Cunha & Oricchio Advogados, Gustavo Viseu, é ainda mais duro na crítica às mudanças feitas pelos congressistas às regras atuais para pagamento de dívidas oriundas de precatórios. “A aprovação da PEC 12 pela CCJ evidencia, mais uma vez, que neste país os interesses dos governantes prevalecem sobre os dos contribuintes”, ressalta.

Ainda de acordo com o advogado, “este é mais um capítulo triste da história política do Brasil”. “Estamos às vésperas do terceiro calote sobre os credores de precatórios. Tivemos uma moratória em 1988, uma em 2000, e agora, a mais absurda das propostas está prestes a ser aprovada”, afirma.

Na opinião dele, a PEC 12, como apresentada no relatório aprovado ontem pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado, “é evidentemente inconstitucional, pois contém uma série de violações a princípios fundamentais da Constituição, sobretudo o da moralidade pública”.

Segundo Viseu, “nada garante que a PEC resolverá o problema dos precatórios. Pelo contrário, tudo indica que o quadro se agravará, o que pode ser constatado pelo resultado lamentável das moratórias anteriores. O resultado será a perpetuação dos precatórios. Em alguns estados e municipios, nossos calculos indicam que não seria possível quitar os atuais precatórios pendentes em menos de 100 anos”.

Ele propõe colocar um fim “no regime de impunidade dos agentes políticos. É preciso fazer cumprir a Constituição e as leis em vigor e assegurar o regular funcionamento das instituições públicas”.

Calote institucionalizado atinge todos os governos

Precatório é uma ordem judicial irrecorrível para que o governo pague a dívida ao credor. Teoricamente, este pagamento deveria ser imediato. Mas na prática não é isso que ocorre. O que se vê é um acúmulo de dívidas em todos os estados e municípios e nem mesmo o governo federal escapa deste chamado calote institucionalizado. O problema é ainda mais grave quando se trata dos precatórios alimentares (aqueles decorrentes de dívidas trabalhistas). A estimativa, segundo o Movimento dos Advogados em Defesa dos Credores Alimentares (Madeca), é que cerca de 60 mil já morreram antes de receber seus créditos, isso só no estado de São Paulo, que tem atualmente 480 mil pessoas esperando para receber precatórios alimentares. Além disso, ainda de acordo com dados da entidade, o estado paulista está pagando precatórios vencidos em 1998.

Apesar dos precatórios alimentares representarem quase 80% do total da dívida paulista com essas ordens judiciais – São Paulo deve R$ 16,3 bilhões em precatórios, sendo que R$ 11,6 bilhões são alimentares – a prioridade de pagamento é dos não-alimentares. Isso porque pode ocorrer o sequestro de contas do estado, o que não acontece com os alimentares.

Essa demora no pagamento, cerca de 10 anos em média, tem levado muitas pessoas a venderem seus títulos com deságio que pode chegar a até 80%. Empresas compram precatórios com desconto e pagam dívidas tributárias. E até fundos estrangeiros estão recorrendo a precatórios como um investimento de longo prazo.

Gazeta Mercantil, 2/4/2009 – BRASIL, A9

Empresa “aluga” precatório para garantir execução fiscal

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Uma empresa da área de alimentos encontrou uma alternativa diferente, especialmente em tempos de crise, para garantir uma execução fiscal. A empresa optou por alugar um precatório para apresentar à Justiça como garantia de pagamento da execução fiscal, caso perca o recurso que apresentou ao Judiciário. “A minha cliente não tinha bens para dar como garantia e estava sofrendo com a ameaça de penhora on-line das suas contas”, diz o advogado Gustavo Viseu, do escritório Viseu, Cunha e Oricchio Advogados. “Diante disso, idealizamos esse tipo de operação”, conta.

Com uma dívida de R$ 3,5 milhões do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) do estado de São Paulo, que está sendo questionada na Justiça, a empresa só tinha três opções para que a sua contestação fosse analisada pelo Judiciário: depositar o valor questionado integralmente, apresentar bens para penhora em valor igual ou superior ao suposto débito ou entregar uma carta fiança. “Como a empresa não tinha bens neste valor e não tinha o dinheiro, tivemos que buscar uma alternativa para garantir a sua defesa”, diz Viseu.

Num primeiro momento, veio a ideia de comprar o precatório, que normalmente é vendido com deságio de até 70%. Apesar do desconto, a proposta esbarrou na falta de dinheiro da companhia. Em seguida veio a proposta de emprestar, mediante o pagamento de uma comissão, um precatório. “Como temos outro cliente que tem um precatório alimentar do estado de São Paulo, sugerimos que ele oferecesse o seu título para garantir a dívida do outro cliente”, explica.

Viseu comenta que o Código de Processo Civil admite que um terceiro ofereça bens para penhora para garantir a execução. Diante disso, as partes assinaram um contrato extrajudicialmente determinando as regras do acordo. O contrato particular prevê que o locatário pagará 2% ao ano a título de aluguel. “O contrato prevê uma cláusula para cada situação”, diz Viseu que representa tanto a empresa locatária quanto o locador do precatório. As situações possíveis são: a empresa ganhar o processo e o precatório voltar para o seu dono; ou a empresa perder o recurso. Neste caso, ela pode pagar e encerrar o processo, pode fazer depósito em dinheiro e recorrer ou a empresa não fazer nada e o precatório ir a leilão. Caso a decisão judicial seja desfavorável à empresa e o precatório perdido, ela pagará ao locador 40% do valor do título. Atualmente, o deságio na compra de precatório pode chegar a até 70%.

Com faturamento mensal que varia entre R$ 1,5 milhão e R$ 2 milhões, o advogado conta que sua cliente não conseguiria ter seu direito de recurso garantido sem o aluguel do precatório. No processo judicial, as partes optaram por não colocar que se tratava de uma locação. “O CPC admite bens de terceiro para garantir a execução e o credor tem a prerrogativa de aceitar ou não a garantia, mas o juiz pode fazer valer a garantia apresentada”, diz o advogado.

A criatividade da operação foi vista com bons olhos pelo advogado Luiz Rogério Sawaya Batista, do escritório Nunes, Sawaya, Nusman & Thevenard Advogados. “Se o terceiro aceita garantir a execução com o seu precatório, é uma alternativa interessante”, diz o advogado. Para ele, a opção encontrada pelo colega pode ser mais atraente às empresas do que uma fiança bancária, por exemplo. “A fiança bancária é cara e com a crise o crédito está muito difícil”, afirma.

Sawaya conta que uma mudança na Constituição Federal em 2000 dá sustentação para o uso de precatórios para garantia de dívida fiscal. Segundo essa mudança constitucional, há a possibilidade de cessão por terceiros de precatórios para o pagamento de débito fiscal. “O precatório alimentar é mais aceito que o não alimentar, mas o ministro Eros Grau (do Supremo Tribunal Federal) disse que não faz diferença um precatório do outro e não vê problema em aceitar precatório não alimentar para débito fiscal”, comenta Sawaya.

Já o advogado Nelson Lacerda, do escritório Lacerda & Lacerda Advogados, diz que tal garantia pode ser muito arriscada tanto para o dono do título quanto para quem aluga. Para ele, o locador corre o risco de perder o precatório e depois não conseguir receber o valor total do título do comprador. “E se o locador agir de má-fé e der o mesmo título como garantia para outra execução, o locatário pode responder por litigância de má-fé”, alerta. Lacerda sugere aos seus clientes a compra do título, ainda que seja de forma parcelada. “O aluguel pode ficar mais caro do que comprar”, diz.

Gazeta Mercantil, 27/2/2009 – DIREITO CORPORATIVO, A11

Waldemar Jezler – www.libracap.net

Proposta autoriza compensação de débitos fiscais com precatórios

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Cleber Verde quer promover
o encontro de contas entre
o crédito do contribuinte com
o Estado e suas dívidas com o fisco.

A Câmara analisa o Projeto de Lei Complementar (PLP) 436/08, que permite aos contribuintes compensar débitos tributários com créditos de precatórios. A proposta, de autoria do deputado Cleber Verde (PRB-MA), altera o Código Tributário Nacional (CTN).

De acordo com o texto, a compensação será automática. Ou seja, o contribuinte que tiver precatório a seu favor poderá, de imediato, usar o valor do crédito para pagar débito com o fisco estadual e municipal, vencido ou a vencer. O projeto determina que a compensação será feita por decisão judicial, independentemente da ordem cronológica de pagamento do precatório.

O precatório é um direito de crédito que uma pessoa física ou jurídica possui após ganhar uma ação judicial contra um órgão público e que já está na fase de execução.

Justiça
Segundo o deputado Cleber Verde, o objetivo da proposta é dotar o Poder Judiciário de meios para promover o encontro de contas entre o crédito do contribuinte com o Estado, representado pelo precatório, e as suas dívidas com o fisco.

Ele afirma que o CTN já permite que estados e municípios compensem as dívidas tributárias com “créditos líquidos e certos”, categoria em que estão os precatórios. Mas a compensação depende de lei local, e poucos estados e municípios aprovaram a regulamentação do dispositivo. Com o PLP 436, caberá ao Judiciário fazer a compensação.

O deputado salienta que há decisões liminares do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ) a favor do uso do precatório para o pagamento de débitos fiscais.

Tramitação
O projeto será analisado pelas comissões de Finanças e Tributação; e de Constituição e Justiça e de Cidadania. Depois segue para votação em dois turnos no Plenário.

Íntegra da proposta: – PLP-436/2008

Reportagem – Janary Júnior

Agência Câmara

Waldemar Jezlerwww.libracap.net

EMPRESAS RECORREM A PRECATÓRIO PARA PAGAR DÍVIDAS TRIBUTÁRIAS

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São Paulo, 19 de Janeiro de 2009 – Apesar da crise financeira, o comércio de precatórios segue aquecido e tem sido uma alternativa para as empresas quitarem suas dívidas fiscais e, ao mesmo tempo, reduzir a carga tributária. Segundo o advogado Ricardo Bolan, do Lefosse Linklaters, esse mercado, apesar de ser “bastante sensível, permanece aquecido”. O advogado Nelson Lacerda, do Lacerda e Lacerda Advogados, por exemplo, diz que desde o início da turbulência econômica houve um aumento de 50% nas orientações com relação ao comércio de precatórios e espera um índice maior ainda para este início de ano. “Várias empresas estão com débito em caixa e a compra é uma maneira de reduzir as dívidas garantidas”, explica. Lacerda diz acreditar que a tendência deve prosseguir porque até os “mais conservadores” estão optando pela aquisição do títulos.

E até escritórios que não atuavam nesta área começam apostam nesta tendência. É o caso do Abdo Advogados. A banca, que não assessorava a aquisição do título, no último trimestre, teve um aumento de 50% na demanda por orientações para saldar dívidas fiscais. “O proveito traz economias para a empresa. O deságio é de 30%, a compensação do tributo é calculada no valor original, o que permite o pagamento de até 30% do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços)”, diz Guilherme Sesti Santos, advogado da banca.

Fundos

Há menos de um ano, o comércio de precatórios também era uma alternativa de investimento para fundos estrangeiros. Diversos escritórios do País assessoravam esses fundos na compra do título federal ou do governo paulista. No caso do Lefosse, três clientes (fundos estrangeiros) compraram, no início do ano passado, mais de R$ 1,6 bilhão em precatórios. À época, especialistas afirmavam que o retorno era de até 70% do valor investido. Mas a crise financeira, provocou uma paralisação neste tipo de comércio. “Hoje, a compra pelos fundos é nula”, diz Bolan. “O Brasil atrai muitos investidores estrangeiros. E os precatórios eram um modo de conseguir dinheiro, já que o prazo para pagamento é em média de 10 anos e a correção aumenta o valor do título. Mas, atualmente o interesse por precatórios aumentou nas empresas brasileiras.”

Apesar da queda de interesse do investidor estrangeiro, alguns escritórios já começam a percebe um movimento de retorno dos fundos. É o caso, por exemplo, do Viseu, Cunha e Oricchio. “Como a bolsa está volátil, prefere-se optar por novos ativos. Compra-se precatórios por um valor bem menor do que vale e, mesmo que demore para receber, os juros e a correção atualizados facilitam a espera”, diz Gustavo Viseu.

Gazeta Mercantil,  Fernanda Bompan

Waldemar Jezlerwww.libracap.net – 1/19/2009

Supremo e STJ decidirão questões essenciais sobre uso de precatórios

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Dúvidas ainda existentes em relação ao pagamento e à compensação de precatórios podem ser definitivamente resolvidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2009. Sem data ainda para serem levadas a julgamento, os ministros devem decidir, por exemplo, se há a incidência dos juros de mora sobre as parcelas dos precatórios não alimentares – que deveriam ser pagas anualmente por Estados e municípios, como estipulou a Emenda Constitucional nº 30 de 2000.

A corte também poderá encerrar a discussão sobre a possibilidade do uso dos precatórios alimentares para o pagamento de tributos. A depender do resultado da questão, o impacto sobre o mercado de compra e venda de precatórios poderá ser grande. Nesses casos, o que há é a compra por empresas desses títulos com um deságio que pode chegar a 80% do valor de face. O objetivo é usar os precatórios para compensar tributos. Como esses temas foram declarados de repercussão geral em 2008, processos semelhantes não poderão mais subir para o Supremo Tribunal Federal e súmulas vinculantes sobre as questões poderão ser editadas pela corte.

Além dessas questões no Supremo, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) também decidirá em 2009 pontos importantes que envolvem o tema. A corte analisará se Estados ou municípios devem autorizar a venda de precatórios a terceiros. A questão, que já conta com julgamentos favoráveis no próprio STJ no sentido de não ser necessária a anuência do devedor, deve ser julgada pela corte especial do STJ. O recurso que aborda a questão foi considerado como repetitivo, o que significa que todos os processos semelhantes ficam suspensos até uma decisão definitiva da corte. O julgamento é considerado importante, pois há magistrados que só admitem a cessão do precatório se houver a anuência do devedor.

Discussões como essas intensificaram-se a partir de 2000 com a edição da Emenda Constitucional nº 30. A norma, redigida com o objetivo de resolver os atrasos no pagamento dos precatórios, deu prioridade ao pagamento dos alimentares. Estes deveriam ser quitados no ano seguinte da decisão transitada em julgado, em no máximo 18 meses. Além disso, estabeleceu-se que os não alimentares poderiam ser parcelados em até dez vezes, para que assim houvesse condições de pagar os alimentares. Porém, apesar de a emenda constitucional estabelecer que incidem juros legais sob essas parcelas, a norma não deixou explícito se incidiria ou não os juros de mora – pena imposta ao devedor pelo atraso no cumprimento da obrigação.

No caso dos precatórios alimentares, já existem decisões do Supremo dizendo que só incide juros de mora se o Estado ou o município atrasar o pagamento do título, mas em relação às parcelas dos precatórios não alimentares ainda há dúvida sobre a incidência. Segundo o advogado Nelson Lacerda, do Lacerda & Lacerda Advogados, o STJ, na maioria das vezes tem decido pela incidência dos juros de mora sobre as parcelas. Para ele, o entendimento deve também ser adotado pelo Supremo. “Não houve um acordo para que esses precatórios fossem parcelados, foi uma imposição da emenda constitucional, por isso acredito que prevaleça o bom senso com relação a esse direito”, afirma o advogado. Atualmente essas parcelas são corrigidas com juros de 6% ao ano. Ocorrendo a aplicação dos juros de mora, há um acréscimo de cerca de 1%. Em São Paulo, o Tribunal de Justiça (TJSP), em grande parte de seus julgados tem seguido a mesma linha das decisões relacionadas aos precatórios alimentares e tem entendido que só incide juros de mora se houver atraso no pagamento.

A questão da compensação de alimentares com tributos também não está clara na Emenda Constitucional, de acordo com advogados. Isso porque, como a emenda determina o pagamento dos alimentares no ano seguinte da decisão transitada em julgado, não está nítido se esses precatórios também poderiam utilizar-se da compensação. Em relação ao tema, há decisões isoladas no STJ que foram desfavoráveis à compensação. Para o advogado Gustavo Viseu, do Viseu, Cunha, Oricchio Advogados, esta posição deve ser mantida no Supremo. “A Emenda Constitucional nº 30 não abarcou a possibilidade de parcelamento e nem de compensação para precatórios alimentares”, afirma. Já para o advogado Nelson Lacerda, a compensação deve ser liberada para todo e qualquer tipo de precatório sem distinção.

Segundo ele, há pareceres do Ministério Público e decisões monocráticas de ministros do Supremo favoráveis a isso. Além disso, ele cita uma ação direta de inconstitucionalidade (Adin) julgada em outubro de 2004, que declarou constitucional uma lei do Estado de Rondônia que prevê a compensação de crédito sem distinção.

Adriana Aguiar, Valor Online

Waldemar Jezlerwww.libracap.net – 1/2/2009

STJ veta conversão de precatórios e restringe mercado

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Decisões recentes do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ameaçam o mercado de compra e venda de precatórios no país e criam o risco de as empresas que compraram títulos de caráter alimentar acabarem tendo que encarar a fila cronológica de pagamento de Estados e municípios para receber – em geral atrasadas em anos. Os ministros da corte têm negado o pedido das empresas de transformarem precatórios de natureza alimentar em não-alimentar – e assim usarem esses títulos, comprados com deságio no mercado, para compensar com tributos devidos. A possibilidade de compensação de tributos com precatórios alimentares já está no aguardo de julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF), onde ganhou status de repercussão geral – o que significa que processos que discutem o mesmo tema ficam impedidos de terem recursos remetidos à corte até que ela defina a questão.

A disputa entre os fiscos dos estados e municípios e os contribuintes em torno da possibilidade de compensação de tributos com precatórios alimentares surgiu a partir da interpretação da Emenda Constitucional nº 30, de 2000, que alterou o artigo 78 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT). A emenda estabelece que precatórios não-alimentares – decorrentes de indenizações por desapropriações, por exemplo – cujos pagamentos estão em atraso podem ser compensados com tributos devidos e também sujeita o poder público ao seqüestro de suas contas caso haja atraso na quitação dos títulos. No entanto, não deixa claro se as mesmas possibilidades se aplicam também aos precatórios alimentares – que surgem a partir de ações judiciais de servidores que cobram aposentadorias e indenizações.

Se o Supremo negar a possibilidade de compensação de dívidas tributárias com precatórios alimentares, às empresas que possuem esses títulos só restará buscar uma decisão transitada em julgado que garanta sua conversão para títulos de caráter não-alimentar – o que, em geral, não tem sido a posição do STJ. Em um caso recente, o ministro Francisco Falcão, da primeira turma da corte, manteve o caráter alimentar de um precatório comprado pela empresa Asun Comércio de Generos Alimentícios, assessorada pelo advogado Nelson Lacerda, do escritório Lacerda & Lacerda Advogados. A empresa argumentava que o precatório, comprado de uma pensionista do Instituto de Previdência do Estado do Rio Grande do Sul (Ipergs), não teria mais caráter alimentar, já que não se destina mais para esse fim. Porém, o ministro rejeitou a argumentação ao entender que Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) não analisou essa argumentação.

A decisão não é isolada, mas, apesar das decisões contrárias no STJ, Nelson Lacerda afirma que já tem decisões transitadas em julgado no TJRS que garantem a conversão. Ele também se diz confiante com relação à última palavra do Supremo no julgamento que está sendo aguardado – segundo ele, há grande chances de que a compensação seja válida para todos os precatórios. Isso porque já há um parecer favorável do Ministério Público Federal em outro processo que envolve um precatório alimentar e está pendente de julgamento na segunda turma do Supremo. Como no parecer o Ministério Público não fez distinção entre a compensação de precatórios alimentares e não-alimentares, Lacerda acredita que não necessitará dessa conversão para que as empresas possam ser liberadas para compensar com tributos.

Outro precedente favorável à compensação seria o julgamento de uma ação direta de inconstitucionalidade (Adin) em outubro de 2004 – a Adin nº 2.851-1 -, que declarou constitucional uma lei do Estado de Rondônia que prevê a possibilidade de compensação de crédito. No julgamento, também não houve a distinção entre alimentares e não-alimentares. Além disso, o advogado cita mais duas decisões – uma do ministro Eros Grau, de agosto de 2007 e outra da ministra Ellen Gracie, de agosto de 2006, favoráveis à compensação e que devem manter sua posição.

Enquanto não há uma definição sobre o tema – o julgamento do caso no Supremo não tem data para ocorrer e o processo ainda aguarda um parecer do Ministério Público Federal -, o advogado Telmo Schorr, presidente da Comissão de Precatórios da seccional gaúcha da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RS), acredita que as decisões recentes do STJ devem desestimular o mercado paralelo de venda de precatórios, já que ainda não há segurança para fazer compensações. Para ele, que assessora diversos credores de precatórios alimentares, essa decisão do STJ é positiva. “Se grandes empresas tiverem que entrar na fila para receber, pode haver uma pressão maior contra os governos para que sejam tomadas providências com relação ao atraso destes pagamentos”, diz.

Adriana Aguiar, de São Paulo
Valor Online

Waldemar Novoa Jezler – www.libracap.net – 12/26/2008

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